Do prazer do silêncio
O silêncio é um amigo que nunca trai.
Como sou grato ao silêncio que tenho desfrutado, desde a última encruzilhada!
Ultimamente, o silêncio tem sido um companheiro valioso. Ao vestir o manto do pária e do indesejado, tenho recebido dos meus mais queridos companheiros o dom de não ouvir suas vozes nem compartilhar de suas maravilhosas presenças. Como minha Deusa tem sido boa comigo!
No silêncio, encontramos cada vez menos utilidade aos signos e sinais; a palavra, como bom vinho, é guardada no fundo de nosso íntimo, para fermentar e ser consumida em ocasião apropriada. A linguagem do espírito desvela-se a cada passo, e que caminho maravilhoso tem sido.
O silêncio é um elogio. Revela mais do que as pretensas palavras poderiam, onde aqueles que mais falavam de outros líderes revelam sua pequenez ao utilizar-se dos exatos mesmos métodos e éditos para fazer progredir sua agenda política, e aprazendo-se de sua própria esperteza (*rs*) tolhem a liberdade alheia, esta gigantesca ameaça para aqueles que não possuem a própria.
O silêncio é uma porta. Tudo que é represado e forçado busca o equilíbrio e a harmonia, esta é a Lei do mundo. A represa, a porta do grito de rebeldia, antecede a revolução prometeana dos portadores da (própria) luz, que se recusam a mendigar o fogo alheio – e cerram a visão daquele que se ao menos ouvisse, poderia entender a discórdia como o primeiro vigia ao ataque externo.
O silêncio é um abraço. Ao virar as costas e voltar à caminhada, a estrada e o horizonte se abraçam, e o ciúme dos que encontram nos grilhões sua mochila se torna um voto de boa viagem, quando se possui a coragem para ousar.
O silêncio é o uivo invisível, o punho cerrado travestido de mão aberta, a espada morta, aquilo que não é esperado pelo inimigo. Os tolos os desperdiçam como pedras a serem arremessadas aos inimigos, os vaidosos o vestem como a roupa mais bela que possuem, e os caminhantes o tem como companheiro.
Ao silêncio!
Advogado, tradutor, carioca, 48 anos e morador de São Paulo. Há quase vinte anos atrás, sacerdotes e sacerdotisas me levaram para um templo entre mundos e me trouxeram de volta à vida – desde então, entre o staccato dos trovões, o tilintar de taças e um coral de risos eu faço meu ofício e desempenho meu papel entre os filhos dos Deuses Antigos.